"... deitar com uma mulher e dormir com ela, eis duas paixões não somente diferentes mas quase contraditórias. O amor não se manifesta pelo desejo de fazer amor (esse desejo se aplica a uma série inumerável de mulheres), mas pelo desejo do sono compartilhado (este desejo diz respeito a uma só mulher)..." (A insustentável leveza do ser - Milan Kundera)

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quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Um brasileiro em Terras Lusas


Fortalecer Comunidades e Unir Continentes como bolsista da Fundação Rotária 

Coimbra terra de encanto
Fundo mistério é o seu.
Chega a ter saudades dela
Quem nunca nela viveu

É com um misto de tristeza e alegria que escrevo este relatório final. Tristeza por ver que esta etapa da minha vida aproxima-se do fim, alegria por ter a certeza de ter aproveitado ao máximo essa experiência proporcionada pela bolsa educacional da Fundação Rotária que me permitiu estudar em Coimbra durante este ano letivo de 2010/2011.
Agradecimentos nunca são demais, por isso reitero todas as palavras que proferi no relatório anterior destacando principalmente, os companheiros José Cerca e o professor José Ribeiro Ferreira, que representaram a Fundação Rotária e o Rotary muito bem, e me ajudaram em tudo o que foi possível neste ano que se passou. Estendo os agradecimentos, também, à “Dona Mila”, esposa do companheiro José Cerca. Juntos os dois foram minha família no Velho Mundo. Sem eles, minha função como Embaixador da Boa Vontade e minha estadia aqui não teriam tido sucesso.
            Neste ano que estive em Coimbra muitas coisas aconteceram. Posso afirmar sem sombras de dúvidas que todos os acontecimentos durante esse ano fizeram de mim uma pessoa melhor tanto no âmbito acadêmico quanto no pessoal. A estadia em Coimbra possibilitou-me o contato direto com a teoria, ensinada na Universidade, e a prática, espalhada pelos diversos monumentos históricos de Portugal e da Europa. As considerações sobre História da Arte e Património discutidas em sala de aula eram logo postas a prova nas diversas viagens de estudo que pude participar. Pude ver exemplares originais desde o renascimento italiano ao barroco contra-reformista, da arquitetura gótica e romanica à arquitetura manuelina, dos fortes militares aos palácios reais, dentre vários outros assuntos referentes ou não à História da Arte. Por isso destaco que sem a bolsa de estudos, dificilmente conseguiria unir essas duas vertentes do ensino, a teórica e a prática.
Este tempo em Portugal além de permitir um aprofundamento de meus estudos, ajudou-me a desfazer muitos mitos referentes a Portugal, ao Brasil e a outros países. O contato que tive com pessoas dos mais diversos locais do globo contribuiu para que mitos fossem quebrados, e verdades fossem esclarecidas. No âmbito pessoal, pude ter contato com pessoas e culturas dos cinco continentes. Dentre eles, destaco países como Macau, Timor-Leste, São Tomé e Príncipe, Angola, Marrocos, Argentina, Venezuela, Espanha, Itália, Alemanha, França, Inglaterra, Holanda e por que não dizer das várias regiões do Brasil. Encontrei-me e discuti sobre diversos assuntos tanto com amigos de outros países como pessoas de estados brasileiros que eu nunca tive contato no Brasil.
Essa heterogeneidade de culturas permitiu-me observar que atrás de cada modo de falar, de cada roupa distinta, de cada religião professada, ou de cada grupo político representado, existem pessoas com um mesmo objetivo: buscar cada vez mais um aperfeiçoamento pessoal para poder beneficiar nosso mundo, fazendo com que culturas distintas possam ser vistas não como antagônicas, mas sim como complementares.
Estive em conversas em que portugueses e angolanos ou timorenses, ou qualquer outro pais colonizado por Portugal pudessem apresentar suas versões sobre um período da História ainda muito cheio de lacunas. Longe de buscar culpados ou inocentes, buscávamos encontrar um plano em comum entre nossas histórias. Pude ver os dois lados de uma história que se passa na Venezuela, atualmente, aqueles que se acham beneficiados e aquele que se acham prejudicados. Pude ver ainda, como num mesmo país, e numa mesma região existem tantas diferenças, como no Brasil. A mesma situação, percebi aqui na Europa. Percebi que se essas diferenças não forem discutidas, entendidas e respeitadas voltaremos a um período da História em que uns se achavam melhores que os outros.
É neste contexto que destaco o papel de um embaixador da boa vontade. Além das várias atribuições inerentes ao “título”, faz-se necessário fomentar discussões que mostrem que dentro das aparentes diferenças entre os povos existe algo que unem todos eles. Essas discussões não devem restringir-se somente às altas esferas governamentais, mas sim a base da sociedade, a população em geral. Quando todos entendermos as semelhanças de nossas diferenças, estaremos a um pequeno passo da paz e da compreensão mundial.
Para exemplificar essa busca pelas semelhanças nas diferenças, utilizo algumas obras do artista plástico norte-americano Jackson Pollock, que viveu na primeira metade do século XX. Aparentemente quando olhamos para suas composições vemos um emaranhado de traços quase que sem sentido, mas depois de um tempo percebemos um ritmo, um padrão, uma certa homogeneidade que nos leva, depois de um desprezo inicial pelas inquietudes da obra, a um estado de contemplação. O mesmo acontece com nossas diferenças culturais. As diferenças num primeiro momento podem ser assustadoras, inquietantes e até provocativas. Porém depois de discutidas e entendidas elas deixam de ser diferenças e passam a ser especificidades de cada povo, de cada país e de cada pessoa que habita esse enorme planeta.
            Assim, de forma direta ou indireta, sempre que me reunia com pessoas que não pertenciam à minha região de residência buscava entender as supostas diferenças que existiam entre nós e procurava desmitificar muitos assuntos que eram tratados pela mídia e pela opinião geral como sendo verdades absolutas. Por isso, acredito que exerci o papel de “Embaixador da Boa Vontade” em todos os momentos que pude contribuir para um maior entendimento das diferenças mundiais. Seja em conversas, nas palestras que proferi, nas discussões com amigos ou nos trabalhos acadêmicos.
Nesse sentido, entendo que o ideal rotário de “Dar de si antes de pensar em si” é intrínseco à natureza humana, porém, em alguns, ele precisa ser trabalhado e desvendado. Uns o reconhecem logo de início, outros demoram um pouco, outros ainda relutam em aceitá-lo e acabam guardando-o bem no fundo de seus sentimentos. É preciso que aqueles que o reconhecem logo de início ajudem essas pessoas a encontrarem o sentido de servir à Humanidade.
Esse é o papel do Rotary e de todos os órgãos ligados ao movimento rotário. Nosso objetivo consiste em mostrar ao mundo os benefícios de servir à comunidade sem antes pensarmos em nós mesmos. E para aqueles que nunca fizeram parte de um programa do Rotary as bolsas educacionais da Fundação Rotária são um excelente começo de descoberta e redescoberta. Seguindo esse princípio, participei de várias sessões em Coimbra com o objetivo de reativar o Rotaract Clube daqui. Coimbra sendo uma cidade universitária necessita de um Rotaract ativo e participante. Por isso, acredito que logo em breve o clube estará ativo e pronto para difundir o ideal rotário.
Como membro da família rotária desde meus quinze anos, quando entrei para o Interact e agora pertencente ao Rotaract, acredito que existam muitas maneiras de se viver o Rotary. Uma das formas que encontrei, aqui em Coimbra, foi o de divulgar o ideal rotário através do estudo e divulgação do Patrimônio Cultural da Humanidade. Com isso, acredito veementemente, que podemos fortalecer as comunidades e unir os continentes através do patrimônio cultural. A minha vinda para Coimbra prova isso. No início, o velho e o novo continente unidos por uma bolsa de estudos. Agora, por laços de amizade e cooperação que servirão cada vez mais para fortalecer nossas comunidades.Foi com esse intuito que vivenciei minhas experiências aqui em Coimbra durante esse ano acadêmico.
A bolsa de estudos da Fundação Rotária deixará muitos frutos. Vários deles são os livros que pude comprar para aperfeiçoar meus estudos, e outro fruto importante, além dos descritos acima, é que poderei no ano que vem concluir o Mestrado em História da Arte, Patrimônio e Turismo Cultural já que os professores da faculdade de Letras de Coimbra permitiram que eu escrevesse minha dissertação aqui no Brasil. E para finalizar esse projeto iniciado a um ano atrás, pretendo, em breve, publicar um livro fotográfico em que mostrarei as experiências adquiridas como bolsista da Fundação Rotária e a possibilidade de fomentarmos a compreensão mundial através de nosso patrimônio cultural.

Ezequiel Barel Filho

Agradecimentos


As armas e os barões assinalados
Que, da ocidental praia lusitana,
Por mares nunca dantes navegados,
Passaram ainda além da Taprobana,
Em perigos e guerras esforçados
Mais do que prometia a força humana
E entre gente remota edificaram
Novo Reino, que tanto sublimaram;
(Luís de Camões. Os Lusíadas)

Desde minha chegada em Coimbra sempre pensei em como iniciar meu primeiro relatório como bolsista da Fundação Rotária. Mesmo seguindo todos os passos descritos no manual e as orientações do coordenador, expressar nossas idéias no papel é mais difícil do que imaginá-las.
Por isso, tomo emprestado os versos de um dos fundadores de nossa língua para exemplificar meu sentimento em poder iniciar esta nova empreitada em minha vida. Empreitada que só se tornou possível graças a um conjunto de pessoas que me permitiram passar além da Taprobana, por mares nunca dantes navegados. E são elas que gostaria de agradecer no início deste relatório.
Dentre todos meus agradecimentos, primeiro agradeço a Deus. Mesmo nos dando o privilégio do livre arbítrio sempre nos ilumina e nos mostra o caminho certo a seguir. Posteriormente e sem nenhum grau de hierarquização, agradeço ao Rotary Club de Itapira, ao Distrito 4590, à Fundação Rotária e ao Rotary International por viabilizarem, financeira e logisticamente, minha vinda para o velho continente, sendo mais específico, para Coimbra, a “Cidade do Conhecimento”. Por fim, e não menos importante, agradeço a meus pais, amigos e familiares, que sempre me incentivaram a seguir adiante nesta nova empreitada de minha vida.
Toda adaptação é em certa medida difícil. O que nos ajuda a superar essas dificuldades são as pessoas que nos cercam nessa nova vida. Sendo assim, não poderia deixar de tornar público meus sinceros agradecimentos aos companheiros rotarianos Sr. Governador Armindo Carolino e Álvaro Gomes que me atenderam prontamente no que diz respeito à minha chegada em Portugal. À companheira Anabela Amaral que me recebeu de forma muito simpática no aeroporto, mesmo após ter esperado por horas devido ao atraso da minha conexão em Madri. E, seguindo os trilhos do comboio, já em Coimbra, agradeço aos companheiros José Cerca da Silva e o professor José Ribeiro Ferreira, do Rotary Club de Coimbra, que desde então tem me auxiliado e me orientado em muitas questões. Sem eles minha adaptação teria sido difícil.
Não posso deixar de citar os amigos que conheci nos corredores do Grande Hostel Coimbra, aqueles que juntaram-se a nós no decorrer deste ano e os amigos de curso. Sem sombra de dúvidas, as cervejas, os finos, as sangrias e as tostas, tomadas e saboreadas no Xis, no Tropical ou no Bar da Associação não teriam o mesmo gosto se não fossem com vocês. Paro por aqui, pois necessário muitas páginas para agradecê-los.

A escolha de Coimbra para empreender meus estudos não foi ao acaso. Escolhi estudar nesta Universidade pelo seu renome, tradição e pelo esforço feito na área do Patrimônio Cultural. Meu objetivo, aqui, é entender o processo histórico de formação de nossos patrimônios culturais e a partir daí, propor meios de preservação e uso desses patrimônios, no Brasil. Hoje, é imprescindível que além de preservado, o patrimônio deve ser integrado à vida de quem o pertence, neste caso, toda a população.  Por uma questão de “militância” procuro estudar os patrimônios culturais brasileiros, que na sua grande maioria são de origem portuguesa.
(...)
Por fim, reitero os agradecimentos feitos no início e destaco minha felicidade em poder participar deste programa de bolsas educacionais da Fundação Rotária de RI. Já vivenciei muitas coisas novas e tenho certeza que muitas outras virão. E para finalizar gostaria de fazer meus, os versos cantados por Amália Rodrigues num Fado chamado Coimbra.
Coimbra é uma lição
De sonho e tradição
O lente é uma canção
E a lua a faculdade
O livro é uma mulher
Só passa quem souber
E aprende-se a dizer saudade
Coimbra do choupal
Ainda és capital
Do amor em Portugal, ainda
Coimbra onde uma vez
Com lágrimas se fez
A história dessa Inês tão linda
Coimbra das canções
Coimbra que nos põe
Os nossos corações, à luz...
Coimbra dos doutores
Pra nós os seus cantores
A fonte dos amores és tu.


Ezequiel Barel Filho